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Eirunepé e a Coca-Cola: O doce capítulo do açúcar mascavo que chegou ao fim

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No início dos anos 2000, o município de Eirunepé, ganhou projeção nacional ao participar do Projeto Gramixó, que transformou comunidades ribeirinhas em fornecedoras de açúcar mascavo para a Coca-Cola Brasil.

A iniciativa começou em 2001, com maior visibilidade entre 2004 e 2005, quando comunidades como Vila União passaram a produzir diariamente até 600 quilos de açúcar mascavo durante a safra, em uma área de cerca de 70 hectares de cana-de-açúcar. O produto era enviado para Manaus e utilizado na fabricação do xarope concentrado da empresa.

O projeto trouxe uma fonte inédita de renda para os ribeirinhos. Cada família envolvida conseguia obter em média o equivalente a um salário mínimo por mês com a venda do açúcar, valor significativo para a realidade local na época. No entanto, quase metade desse rendimento era consumida por custos de produção e transporte, reduzindo o lucro líquido. Ainda assim, o projeto ajudou a movimentar a economia de Eirunepé e deu visibilidade à produção amazônica.

José Geildo Nascimento Monteiro, 27 anos, presidente da Comunidade de Vila União e responsável pela administração do entreposto nessa época, destacou como a chegada do projeto mudou a vida dos moradores:

“As casas hoje têm teto de zinco, antes era tudo de palha. Há TV e até aparelho de som, mas a pobreza ainda é a marca mais perceptível.” (Isso em uma entrevista em 2002)

Geildo dividia a liderança com Raimundo Nonato da Silva de Souza, conhecido como Gaio, presidente da Associação dos Produtores de Cana-de-açúcar de Vila União, na época, Segundo eles, a Vila União tinha capacidade de produzir até 600 quilos de gramixó por dia, podendo dobrar a produção com a chegada de uma nova moenda que, no entanto, veio sem motor, o que poderia significar meses de espera em plena Amazônia.

Agora a pergunta é por que acabou?

Apesar do impacto inicial, o fornecimento de açúcar mascavo para a Coca-Cola não se sustentou a longo prazo. Entre os principais fatores que levaram ao fim do projeto estão:

  • Custos logísticos elevados: O transporte fluvial até Manaus encarecia o produto e reduzia os ganhos das famílias.
  • Dependência de apoio institucional: O projeto necessitava de suporte do governo estadual para escoamento e manutenção de equipamentos. Com a redução desse apoio, a continuidade ficou inviável.
  • Padrões industriais rigorosos: A variação natural do açúcar mascavo muitas vezes não atendia às exigências industriais da empresa.
  • Mudanças no mercado: A Coca-Cola passou a buscar fornecedores mais estáveis e baratos em outras regiões.
  • Baixa rentabilidade local: Para muitas famílias, o esforço de produção não compensava o retorno financeiro.

Um legado esquecido, mais não pelo Eirunepé Notícias

O fim do projeto deixou marcas importantes. Para muitos, foi uma experiência que mostrou o potencial da agricultura familiar amazônica, mas também evidenciou a fragilidade de iniciativas que dependem de apoios externos e de mercados instáveis.

Hoje, restam apenas memórias de quando Eirunepé e suas comunidades foram protagonistas na cadeia produtiva de uma das maiores empresas do mundo. Um capítulo doce, mas breve, que ainda provoca reflexões sobre a valorização da produção local e a sustentabilidade de projetos na região.

Muita gente pode até esquecer, mas o Eirunepé Notícias vai relembrar histórias que marcaram a nossa economia e a vida das comunidades. Histórias de um tempo em que Eirunepé produzia, vendia e movimentava renda, quando projetos deram esperança e mudaram a realidade de muitas famílias. A partir deste domingo, vamos abrir esse espaço para contar memórias que não podem se perder, porque entender o que fomos também ajuda a pensar o que ainda podemos ser.

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